este texto é do ismael caneppele que escreve aqui.
minha mãe tem muitas amigas que perderam filhos. aqui no interior do rio grande do sul muitos garotos morrem quando são adolescentes. a vida é meio muito mais perigosa por aqui. caminhões correm e as bicicletas sempre precisam aprender a voar. vômitos sufocam e muitos nunca acordam. melancias e atravessar o rio ao anoitecer e muitos submergem. sem contar os que caem de pontes. prédios. torres. a vida adolescente no interior do rio grande do sul é a death. por trás dos pastos afiados o orvalho brilha de um jeito que pode ser complicado entender.minha mãe veio dizer que ela tem vontade de explicar para as amigas que perderam seus filhos que todos os filhos morreram. que todas as mães são sozinhas quando os anos acabam. que aquele filho que elas têm na memória já morreu há muito tempo. que cada ano que passa é uma morte e as crianças nunca mais voltarão para casa. que ela também perdeu os seus filhos sem que eles tenham sequer morrido.terminei de escovar os dentes. depois desse dia nunca mais acordei vivo por inteiro. nunca mais olhei para os olhos da minha mãe por inteiro. ela entende o segredo que quase ninguém conhece. somos feitos da mesma matéria. solidão e perda. mesmo quando é sem querer. mesmo quando é só de verdade.às vezes a realidade fica sem graça.
Um comentário:
A realidade não é sem graça, ela é mesmo chata. E sim, somos mesmo todos feitos de solidão e perda. Cada dia que passa eu tenho mais certeza disso.
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