quarta-feira, 30 de abril de 2008

nossos caminhos tortos

ontem eu fui com a minha mãe à perícia médica.
de repente ela me disse: - acho que a sala que eu vou ser atendida é aquela ali (apontando a sala), aquela só pode ser a sala do neurologista porque ali só entram pessoas tortas.
eu acho que eu não disse nada.
mas, eu queria contar pra ela como tentar ser reta me deixou torta.
eu queria contar pra ela da ternura que eu sinto pelos que ousam não seguir reto.
eu queria contar pra ela as coisas tortas que me habitam.
compartilhar com ela a paixão que eu sinto por todas as imperfeições.

às vezes ela me mostrava umas pessoas e uma coisas e insistia para eu colocar os óculos (e acompanhar o que ela via).
de repente eu disse que eu não suportavam ver mais do que eu já enxergava sem os óculos.
não sei o que ela pensou, mas chegamos - as duas - em casa sem óculos.

domingo, 27 de abril de 2008

personagens

João e Maria
Chico Buarque


Agora eu era o herói
E o meu cavalo só falava inglês
A noiva do cowboy
Era você além das outras três
Eu enfrentava os batalhões
Os alemães e seus canhões
Guardava o meu bodoque
E ensaiava o rock para as matinês

Agora eu era o rei
Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei
A gente era obrigado a ser feliz
E você era a princesa que eu fiz coroar
E era tão linda de se admirar
Que andava nua pelo meu país

Não, não fuja não
Finja que agora eu era o seu brinquedo
Eu era o seu pião
O seu bicho preferido
Vem, me dê a mão
A gente agora já não tinha medo
No tempo da maldade acho que a gente nem tinha nascido

Agora era fatal
Que o faz-de-conta terminasse assim
Pra lá deste quintal
Era uma noite que não tem mais fim
Pois você sumiu no mundo sem me avisar
E agora eu era um louco a perguntar
O que é que a vida vai fazer de mim?

*** De tanto não ter vocação para as opções de personagens que foram me aparecendo eu comecei a escrever e a parir quem eu realmente posso ser...

"de perto ninguém é normal"

quando eu abro o jornal eu leio o obituário e a previsão do tempo, mesmo sabendo que ela nunca se confirma.

quando eu ligo a TV eu sempre dou uma conferida na TV senado.

nas revistas eu sempre olho as roupas que eu não me dou ao luxo de comprar.

da avon eu compro coisas que eu não sei usar.

eu compro canetas e lápis e papéis de forma quase compulsiva, apesar de escrever sempre ao computador.

e o teu lado B?

Fonte: http://www.laurapeixoto.com.br

Meu lado B
Todo mundo tem um...
O meu inclui comer batatinhas Chips, com bastante gordura saturada.
O meu lado B é soturno, bizarro e brega.
Chorar na frente do dvd dos Doces Bárbaros, por exemplo, lembrando minha adolescência nessa cidade fudida,
quando a gente brincava de passar na Zona no São Cristóvão só para ver quem estava por lá....
Numa certa noite, encontramos o chevrolet do pai de uma amiga, na frente de uma das casas de luz vermelha.
Voltamos caladas e sem graça para o centro. E nunca mais fomos passear na Zona.
Ficamos com medo de encontrar nossos próprios pais.
Meu lado B inclui pensamentos suspeitos que não confesso nem no divã.
Se divã houvesse.
Meu lado B adora o Fagner quando ele canta
“Tenho um coração dividido entre a esperança e a razão. Tenho um coração, bem melhor que não tivera...”
Meu lado B adora comer com as mãos porque um xamã disse que para ter bons orgasmos
é imperioso comer só com as mãos.
Meu lado B adora lábios e todas suas conseqüências.
Meu lado B detesta coisas extremamente razoáveis e curte uma incoerência.
Meu lado B é autodestrutivo: cerra as portas para arrombar frestas...

novo cd da adriana calcanhoto - maré

..."A uma hora dessas
por onde passará seu pensamento
Por dentro da minha saia
ou pelo firmamento?"

(música "seu pensamento")

eu queria dar conta do meu pensamento e às vezes (só às vezes) saber do teu.

máscara, homem quase pelado e nenhuma fantasia

show masculino

(não é paradoxal que as mulheres que tanto lutaram para não ser objetos de cama e mesa, agora contratem homens anabolizados para se divertir?)

eu fui a uma festa de máscaras com direto a show masculino.
é, eu nunca tinha visto assim tão de perto.
se bem que eu olhei a uns bons metros de distância... e não por falta de opção, mas porque longe é o meu jeito de ir chegando perto das coisas.
antes de sair de casa, ao me olhar no espelho de máscara eu me senti numa atmosfera ney matogrosso.
a máscara me deu um nó: o que é mesmo se libertar? pôr uma máscara ou mostrar a cara?
não sei. não sei. não sei mesmo.
quando os homens começaram a entrar e as mulheres a "aproveitá-los", eu achei escatológico.
depois eu fui olhando e querendo entender.
acho depois dos 30 a gente sabe jeitos mais sensuais de tirar a roupa - da gente e dos homens.
uma história confessada, uma piada interna, um jeito de rir com o cérebro, o sentir-se escolhida numa multidão e por aí a coisa vai e nunca mais volta.
não tive vontade de colocar a mão na bunda de homem que não se deixa beijar na boca.
um homem contratado que está ali ao alcance de todas.
homem é aquele que quebra os contratos, que tem um corpo acompanhado de um cérebro, que te faz única no meio de uma multidão e te faz acompanhada na pior solidão. aquele que sabe te alcançar e não se coloca ao alcance de todas.
e o tesão da caça? show masculino é pescar num aquário...
e a máscara? sexo não é o lugar onde as máscaras caem para que as fantasias aconteçam?
não sei se as mulheres fazem por tesão, diversão, status, para entrar na roda, para ter uma foto para colocar no orkut ou para colar o pentelho do cara na agenda ou mostrar às amigas.
umas olhavam para as outras e diziam: te libera.
liberdade não seria submeter o homem ao nosso show, ao invés de nos subtermos ao show deles?
entrar num show masculino não me libera.
me libera me submeter a mim mesma.

eu nunca soube se eu chego antes ou depois nos lugares que eu habito.
mas, sempre e sempre eu me sinto tão colona, tão fora, tão estranha.
mas, assumir as minhas máscaras e tirá-las é meu jeito de ser fiel a mim mesma.
me submeter ao que acredito talvez seja a minha última crença e o meu único esforço para fugir – da morte e da vida.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

eles sempre chegaram antes

"Lúcia Já-Vou-Indo", da autora Maria Heloísa Penteado
"Esse livro conta a história de uma lesma que era tão devagar, mas tão devagar, que ela tinha marcado uma festa na casa de uma amiga, mas só que em vez dela chegar no dia da festa, ela chegou um dia depois..." (http://www.divertudo.com.br/dicadoleitor68.htm)

Ontem eu tomei coca-cola com duas pessoas que sabem beber vinho.
Ele confidenciou que este livro ("Lúcia já-vou-indo") é o livro que ele sempre procura, mas nunca encontra.
Ela disse que se acha burra e que não confia na memória.
O livro é simples e triste, mas tem a ternura dos que andam fora do ritmo.
No caso deles, eles sempre chegaram antes, e quem chega antes também encontra a solidão.
(Talvez por isto ela se acha burra e prefere esquecer. Talvez por isto ele seja apenas visita na colônia que nasceu.)
Quem chega antes não encontra nem os restos das festas.
Quem chega antes não é compreendido e nem esperado.
Só em corridas de velocidade que quem chega antes ganha prêmio e medalha.
No atropelo disto que denominamos vida, quem chega antes é caso de psiquiatra.
Mas, quem chega antes, sabe partir (nem que for de si mesmo) e se parir antes.
Quem chega antes, se quebra, mas inaugura.
Quem chega antes, não sabe a altura do tombo e por isto não passa "agosto esperando setembro".
Quem chega antes constrói as frestas de fuga para todos aqueles que chegam depois.
Quem chega antes gera as metáforas que possibilita oxigenar a tragédia nossa de cada dia.

Eu gosto tanto deles, porque eles fazem menor o meu medo de chegar (depois) e as suas histórias me dão vontade de chegar mais perto de tudo aquilo que eu só me permito de longe. Sem contar que sabendo que eles já estão lá, eu também tenho um bom motivo pra chegar.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

saudades

eu tenho saudades da malena, da irmã noêmia, do meu vô e da minha vó.
tenho saudades de mentir dor de garganta para poder faltar aula e passar um dia todo na casa da vó.
tenho saudades de ficar feliz com o 10 da prova.
tenho saudades de olhar sessão da tarde no colo da minha mãe.
tenho saudades de ter um cachorro me esperando em casa.
tenho saudades de não ter celular.
tenho saudades do cheiro da nega-maluca que a minha mãe fazia.
tenho saudades de ir pra escola a pé com a turma da rua.
tenho saudades das músicas em fita k7 que eu gravava (bem mal) da rádio.
tenho saudades da menina que um dia eu fui.

a vida no interior - por uma colona (eu)

aqui no interior nenhum padre some no mar, ninguém joga crianças pela janela, a terra não treme, não tem malária e nem dengue. as perebas dos hospitais não são divulgadas.
no interior as pessoas morrem de mofo.
morrem de ter que olhar de frente para si próprias na falta do outro.
morrem na falta da arte que faz a tragédia de cada vida respirar.
morrem na tentativa de ser cidade grande enquanto a mentalidade encolhe.
morrem na falta de sonho, que é onde deveria brotar a vida.
morrem na perfeição de cada flor plantada, que não condiz com o sonho mutilado.
morrem para manter um sobrenome, ou achar um.
morrem para comprar o que não podem, para tentar ser o que nunca serão.
no interior tanta coisa deveria brotar, mas apodrece.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

sem perder a oportunidade

a paisagem da minha janela dos fundos também é um mar de prédios.
hoje eu estava acordando quando uma criança começou a chorar.
voei para abrir a janela, vai que lançam mais uma criança prédio abaixo e eu posso virar uma testemunha famosa.
quem sabe?

pra se matar

é comprovado que várias pessoas se suicidam ao escutarem a musquinha do programa do fantástico, na depressão costumeira que tantos e tantas passam domingo pela noite.

e que jogue a primeira pedra quem nunca passou.

ontem a oportunidade chegou antes: minutos antes de começar o fantástico, o cantor(?) daniel cantou wando no programa do faustão.

eu só não me matei porque hoje é feriado e não é sempre que se pode começar uma semana na terça.

(mas não sei não, minha consciência e minha saudades de acreditar andam me pesando mais que os meus tantos quilos...)

domingo, 20 de abril de 2008

o melhor do pior

'Quando o que você mais teme acontece, você está livre para não temer mais nada. Livre para saber que a vida não pode ser controlada e que há algo de maravilhoso nisso'

(palavras da Cris Guerra)

quinta-feira, 17 de abril de 2008

uma música

(e quem já não sonhou um amor destes?)

Skap

Zeca Baleiro


quando você pinta tinta nessa tela cinza
quando você passa doce dessa fruta passa
quando você entra mãe-benta amor aos pedaços
quando você chega nega fulô boneca de picheflor de azevi- che

você me faz parecer menos só menos sozinho
você me faz parecer menos pó menos pozinho

quando você fala bala no meu velho oeste
quando você dança lança flecha estilingue
quando você olha molha meu olho que não crê
quando você pousa mariposa morna lisao sangue encharca a camisa

quando você diz o que ninguém diz
quando você quer o que ninguém quis
quando você ousa lousa pra que eu possa ser giz
quando você arde alardeia sua teia cheia de ardis
quando você faz a minha carne triste quase feliz

flores?

hoje a telefonista da escola me ligou dizendo que tinha chegado flores pra mim.

eu respirei fundo e falei: tão comum quanto é o meu nome, também é incomum o fato de eu receber flores. confere direitinho e se for mesmo pra mim me avisa.

até agora ela não me ligou mais.

pior que a condição é a consciência da condição.

nem a uma alegria enganada eu me permito mais.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

!

"Ela (Alinne Moraes) diz que está sozinha por uma escolha pessoal." (Terra)
Pra quem é gostosa, até a solidão é justificável!

TUDO tem um lado bom

hoje eu lembrei de uma coisa boa do inverno (e olha que eu estava me esforçando pra lembrar): tomar chá quente antes de dormir. sem contar no aroma que fica pela casa...

(o frio me incomoda para sair da cama, para entrar no banho, para sair do banho, para lavar louça, para lavar roupa, para pendurar roupa...)

( o frio é o alimento preferido da minha preguiça doméstica crônica)

frases do Dr. House (copiadas do Lampadaria)

“Mentiras são como as crianças: apesar de inconvenientes, o futuro depende delas”

“Ainda é ilegal fazer uma autópsia em uma pessoa viva?”

“Se você fala com Deus, você é religioso. Se Deus fala com você, você é psicótico”

“Eu já atingi a cota mensal de exames inúteis para idiotas teimosos”

Uma freira fala para House: “A Irmã fulana acredita em coisas que não são reais”House responde: “Pensei que esse fosse uma exigência para sua atividade”

“Preciso ir, o prédio está cheio de pessoas doentes. Se correr, talvez consiga evitá-las”

“Leia menos… veja mais TV”

“Todo mundo mente” (essa é clássica e é alma do seriado).

pelos ares

paguei para embarcar o resto da minha esperança no teu vôo, mas a tua bagagem cortou as asas da minha última ilusão.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Caso Isabela

E pensar que uma vez Isabela era apenas uma marca de bolacha...

O que me intriga nem é o que levou alguém a jogar uma criança pela janela de um prédio do sexto andar (e não, eu não acho isto normal...)

O que me intriga é o interesse das pessoas pelo caso.
Não é tão simples quanto "exploração da mídia", a mídia só explora o que gera audiência.

Tantos e tantos desviam dinheiro que mata de fome muito mais crianças.
Tantos promovem guerras que matam mais do que um prédio cheio de crianças.
E estes a gente absolve sem nem absorver...

Os pais dos meus alunos não olham mais os cadernos dos seus próprios filhos, pois estão grudados na TV, no caso da Isabela.

Estes dias eu falei para um amigo que eu achava que tamanho interesse se dava pelo fato das pessoas viverem em constante guerra com os seus instintos. Ele me olhou como se eu também fosse capaz de jogá-lo do décimo andar.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

...amém!

ele não tem tempo pra poesia do meu reverso.
ela ainda reza por mim.
e eu continuo sendo entrelinha dos pecados que invento.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

meus monstros

peguei um aluno dizendo para o outro:
o meu pai é querido, bem querido...ele nunca me jogou pela janela do prédio!
eu parei do lado e disse: o meu também.

as monstruosidades tornam os demais humanos quase santificados.

eu nunca joguei ninguém da janela, mas nunca puxei alguém de volta...
e tão poucas vezes eu me permiti o tombo que tornaria menos bambas as minhas direções.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

sempre a mesma pergunta: por que tu escreve?

pra mim, que não chego muito perto das coisas, escrever é uma forma de habitar o tempo, os lugares e os outros. e de me tornar habitável.

mas, se eu soubesse a resposta provavelmente eu não escreveria...

acho que eu escrevo pelo mesmo motivo que leva uma mulher a ter um amante, ou pelo mesmo motivo que leva uma mãe a testar uma receita nova, pelo mesmo motivo que leva um homem a gritar num jogo de futebol, pelo mesmo motivo que leva alguém a se jogar do prédio, pelo mesmo motivo que leva alguém a voltar sempre pra casa.

porque a vida vem vindo e vindo e vindo e a gente corre atrás dela do jeito que pode ou consegue.

eu merecia me sentir merecida

eu merecia não querer as coisas que estão fora do meu alcance. saber esconder. não falar com os olhos e mentir com taaanta dificuldade. ter coragem de chegar mais perto das coisas que gosto. algumas certezas. alguma leveza. menos consciência. menos peso. mais sono. menos trabalho. mais vontade. acreditar.
eu merecia saber encher um cartão de dívidas e com isto me sentir preenchida.
eu merecia saber dominar o meu cabelo e conseguir me sentir feliz com isto.
eu merecia não ficar o tempo todo colocando a casa em ordem na esperança de ordenar o que me atormenta.

às vezes

às vezes eu fico tão desajeitada
que eu não caibo na roupa, nem no dia e nem a noite dá conta de mim.
mas na palavra eu sempre caibo e me acabo.

era uma vez

era uma vez um menino
do dedo verde
das idéias azuis
que adotou um cachorro imaginário

um menino que lanchava
e sabia cozinhar

que plantava pimenta e hortelã

que tinha na boca palavras crianças

que paria nos livros um mundo dos sonhos

um menino que às vezes me fazia sonhar acordada

um menino menino.

que me largou na chuva.
e que acha que meus pés vão secar

2008 - um extrato

eu já mandei 943 mails. (tudo escrito, quase nada "encaminhado")
consumi 200 pacotes de clight (e eu juro que nem ganho comissão)
tive 98 idéias furadas.
cortei duas vezes o cabelo.
matei mais de 300 insetos (eu sou apaixonada pelo "fliti")
assisti a 20 filmes e gostei de 3.
li só um livro bem bom.
recebi 14 mails lindos.
tomei 1 banho de chuva.
pequei TODOS os dias.
quis o mal de alguém 6 vezes.
mordi a língua 24 vezes.
emagreci 2 quilos a um custo enooorme.
contei caloria, juntei um dinheirinho.
perdi a paciência 5 vezes.
engoli seco 23 vezes.
peguei um olho gordo daqueles que mata até pé de arruda e murcha espada de são jorge.
figurei 9 cenas inacreditáveis.
continuo não sabendo nada.
continuo querendo pedir para o mundo párar para eu descer e tomar a fresca.

das (não) condições

eu ando tão atormentada que até a paz me perturba.